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sábado, março 24, 2007

Coragem e coragem

Em recente artigo publicado na Folha Online (clique aqui), o jornalista Gilberto Dimenstein chamou o governador do RJ, Sérgio Cabral Filho, de "corajoso". Segundo o jornalista, a "coragem" do governador veio do fato de que este trouxe à tona os delicados temas da liberação do aborto e das drogas como um dos elementos do combate à criminalidade. Tudo isto seguiu-se ao brutal assassinato do menino João Hélio, que ocorreu na cidade do Rio de Janeiro.

Pois bem... Dimenstein, este símbolo do pensamento politicamente correto da imprensa brasileira, poderia deixar claro sobre o significado da palavra "coragem" ao qual ele se refere. Da forma como está, fica parecendo que o governador é um bravo e destemido cavaleiro, que luta contra as forças do mal que cismam em puxar para trás este Brasil varonil.

O Dicionário Aurélio dá 4 significados possíveis para a palavra "coragem", ei-los:

1.Bravura em face do perigo.
2.Intrepidez, ousadia.
3.Resolução, franqueza, desembaraço.
4.Perseverança, constância, firmeza.

Em qual destes casos o governador se encaixa? Vejamos...

Acaso poderíamos dizer que o governador é um bravo diante do perigo? De qual perigo estamos falando? Do perigo de um embrião desenvolver-se de forma natural e vir a ser um cidadão como qualquer um de nós? Ou será que talvez o governador ache que o embrião é o prenúncio de um futuro criminoso e é necessário dar o direito a que alguém possa eliminá-lo o quanto antes?

Pode ser que o governador esteja na verdade sendo bravo frente ao perigo da criminalidade, que corre à solta no RJ. Será mesmo? Por que então o governador não pára de dar declarações ridículas que têm a finalidade de agradar a certos grupos e vai trabalhar para dar um jeito na polícia do Estado a que ele se propôs governar? Isto seria muito mais eficiente do que, frente ao gravíssimo problema de Segurança Pública, o governador venha a público dar declarações que apenas servem para pavimentar seu futuro político junto a certa parte do eleitorado e dos formadores de opinião.

Continuando...

Será, então, que o governador foi intrépido? Ousado? Difícil acreditar nisto também... Por que só agora Sérgio Cabral vem a público dar tais declarações? Por que ele não teve esta mesma "ousadia" durante as recentes eleições? Onde está a intrepidez, caro jornalista? Onde a ousadia? Fosse ele corajoso mesmo, não seria de esperar que Sérgio Cabral viesse a público durante as eleições e deixasse bem claro o que pensa? Aliás, por que o governador não vem logo a público e diz se é ou não a favor do aborto? Sem meias-palavras tais como "direitos reprodutivos" ou "direito de escolha", por favor. Coragem mesmo: "sou a favor de que uma mãe tenha o direito de eliminar a vida do filho que está em seu ventre". Eu chamo a isto de covardia, das mais baixas a que se pode prestar um ser humano, mas pelo visto tem gente que quer chamar a isto de "coragem". Pois então que venha a público mostrar toda esta intrepidez, ousadia.

Ah... Mas alguém pode vir e dizer: "Ao menos reconheça que o governador foi franco no que disse."

Será mesmo? O timing das declarações do governador indicam, para mim, um frio cálculo político. A verdade é a seguinte: Sérgio Cabral é uma nulidade política. Tipos políticos como ele têm amplo espaço na cena política nacional, principalmente no RJ. Sérgio Cabral é calculista o quanto lhe for necessário para alcançar seus objetivos. Ele soube ficar quietinho em seu canto para não contrariar o casal Garotinho, outro símbolo de tudo o que há de ruim na política do RJ.

Sérgio Cabral só começou a mostrar-se independente de seu companheiro de partido quando ficou claro que sua eleição estava praticamente garantida. Enquanto lhe foi conveniente, nenhuma declaração contrária ao antigo governador podia ser ouvida de sua boca. Isto é que é franqueza!

Pois bem... Afinal de contas, de qual significado de "coragem" estava Gilberto Dimenstein a se referir quando carimbou este adjetivo no governador?

A resposta é simples: nenhum destes. O que o jornalista fez é torcer o significado da palavra até que este encaixasse bem em sua agenda. De quebra, o jornalista gostaria de pegar uma carona na "coragem" do governador e ser ele, também, um "corajoso". Mais ou menos assim: Sérgio Cabral seria o destemido da política e ele, Dimenstein, o intrépido da imprensa.

Dimenstein está seguindo a trilha que muitos jornalistas atualmente seguem no Brasil: é o jornalismo "para a galera". O objetivo deste tipo de jornalismo não é colher fatos e relatá-los, é agradar a um determinado tipo de público, é mostrar-se "progressista", "moderno". É, digamos assim, um jornalismo que quer ser amado, um jornalismo carente, que se apraz recebendo afagos daqueles que são o seu público, e que retribui tanto amor dando abordagem a certos temas exatamente no tom que tais grupos desejam.

É nesse ambiente que um Sérgio Cabral falando de aborto é tratado como corajoso, mesmo que esta palavra jamais possa ser aplicada ao ato do governador. Mas de que importa isto? Afinal, o importante é que a patota seja bem servida.

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